sábado, 21 de novembro de 2015

A INDIGNA PRIVATIZAÇÃO DA TAP



Aos governantes exige-se que consigam ver o país no seu todo. E que façam contas, já não digo de merceeiro, porque esses têm a loja limpa: Sabem que há centros de custo que significam receitas indiretas.

Na privatização da TAP não há nada que não me indigne: a falta de entendimento da sua importância estratégica, a pressa com que um governo de gestão fechou o dossiê, o preço de saldo, o risco financeiro que o Estado continuou a assumir, a falência técnica do comprador e até a suave contestação do PS… Fiquemos por aqui, que o mais grave foi o desprezo absoluto pelos interesses estratégicos do país.

Imagine-se o futuro duma empresa cuja administração decida ter apenas produção e vendas, já que o resto é despesa. Rapidamente se desintegraria a relação com a comunidade envolvente, com as famílias dos seus trabalhadores, não teria formação, marketing, investigação, segurança no trabalho, planos de carreira, limpeza das instalações… Está imaginado? Não é preciso perguntar pelo futuro dessa empresa.

Uma organização não é um conjunto de partes disfuncionais, mas uma soma em que todos contribuem para objetivos centrais. Numa empresa, isso reflete-se em ter centros que são de custo e de receita, junto com outros que são apenas de custo, mas indiretamente essenciais à receita.

Surpreende-me que isto seja menos óbvio para governantes do que para o gestor duma simples PME.

De entre os reptos que Portugal enfrenta, um dos mais importantes é transformar a sua periferização numa nova centralidade. Pela nossa situação geográfica poderíamos ser e não somos o ponto fulcral do ocidente. Pela nossa história, o ponto de encontro de diferentes culturas que tão pouco estamos a ser.

Para isso, é essencial ter uma companhia aérea que seja agente destes interesses estratégicos. Quando mencionamos a TAP, falamos apenas do maior exportador português, e não é qualquer tipo de exportação: É uma empresa que transporta turismo, negócios e cultura para o país. Quantos investimentos se sentam nos bancos desses aviões? Quanto consumo no comércio e serviços? Quanta diversidade cultural?

Por mim, a TAP pode dar prejuízo; defendo que dê muito mais. É essencial ter voos diretos para Pequim e Macau, para a Índia, para vários países da América Latina, para todas as capitais da União Europeia, Moscovo, Tóquio... São voos que significam perdas diretas, e é por isso que os privados jamais os farão. Mas são voos que garantem grandes resultados a um Portugal que precisa de aproveitar a sua posição geográfica, para ser central como poderia, em vez de periférico como é. E isso é dinheiro em caixa, se mais não fosse.

Aos governantes exige-se que consigam ver o país no seu todo. E que façam contas, já não digo de merceeiro, porque esses têm a loja limpa: Sabem que há centros de custo que significam receitas indiretas.

Luís Novais




1 comentário:

  1. Concordo consigo, há coisas que não deviam ser privatizadas. Tal como a TAP, a EDP, os CTT e outros serviços que dão, pelo menos, lucro social. E algumas empresas até davam lucros financeiros chorudos, caso da PETROGAL...
    Caro Luís, tenha um bom fim de semana.
    Abraço.

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